29/10/2025

Mobilidade e qualidade de vida: o papel da ortopedia na paralisia cerebral

Cuidar de uma criança com paralisia cerebral (PC) envolve muito mais do que um único tratamento: é um processo contínuo que depende de um acompanhamento multidisciplinar, envolvendo pediatras, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, psicólogos e outros profissionais especializados. Cada especialista contribui para estimular o desenvolvimento motor, a comunicação, a função cognitiva e a participação da criança nas atividades do dia a dia.

Dentro desse cuidado integrado, a ortopedia pediátrica desempenha um papel fundamental. Ao lidar com alterações musculoesqueléticas, como espasticidade, deformidades e desalinhamentos, o ortopedista ajuda a promover a mobilidade, prevenir complicações e melhorar a postura, alinhamento e independência funcional. Esse trabalho, quando combinado com fisioterapia, terapia ocupacional e demais intervenções, contribui significativamente para a qualidade de vida da criança e o seu bem-estar geral.

O que é a intervenção ortopédica na paralisia cerebral?

A ortopedia na PC envolve o cuidado de músculos, ossos, tendões e articulações para tratar alterações musculoesqueléticas decorrentes da condição. Entre os desafios mais comuns estão a espasticidade (rigidez muscular), deformidades, desequilíbrios posturais e dificuldades na marcha. O objetivo do tratamento ortopédico é corrigir ou minimizar essas alterações, melhorar a função, facilitar a locomoção e prevenir complicações futuras.

As intervenções podem incluir:

  • Fisioterapia e terapia ocupacional precoce para estimular força, coordenação e controle postural.
  • Uso de órteses para suporte, alinhamento e estabilidade.
  • Procedimentos cirúrgicos quando necessários, para alongamento muscular, correção de deformidades ósseas ou tendíneas e prevenção de luxações.

O acompanhamento ortopédico é recomendado sempre que alterações musculoesqueléticas interferem na mobilidade, na postura ou na participação da criança nas atividades do dia a dia. Alguns sinais que indicam a necessidade de avaliação incluem:

  • Dificuldade para andar ou correr, ou marcha alterada.
  • Rigidez ou tensão muscular excessiva (espasticidade).
  • Dor, deformidades nos pés, tornozelos ou quadris.
  • Curvaturas da coluna ou desalinhamentos posturais.
  • Sinais de sobrecarga, como calosidades, pés finos ou desvio da base de apoio.

O diagnóstico é realizado por ortopedistas pediátricos especializados, muitas vezes em conjunto com fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e outros profissionais de saúde, que avaliam a função muscular, amplitude de movimento, força e postura, considerando o histórico clínico da criança.

O tratamento ortopédico na PC é personalizado e pode envolver diferentes abordagens:

Fisioterapia e terapia ocupacional

Essas terapias são fundamentais para manter e melhorar a mobilidade, estimular padrões de marcha eficientes, alongar músculos encurtados e fortalecer a postura. São realizadas de forma contínua, com exercícios adaptados à idade e ao nível funcional da criança.

Órteses

Dispositivos como órteses suropodálicas (AFOs) oferecem suporte e ajudam a corrigir deformidades leves, facilitando a marcha e prevenindo complicações. O uso correto e contínuo é essencial para maximizar os benefícios.

Cirurgias ortopédicas

Em casos de deformidades graves ou contraturas fixas, a cirurgia pode ser indicada. O objetivo é melhorar o movimento, alinhar articulações, aliviar a rigidez e prevenir complicações futuras. Entre os principais procedimentos:

  • Alongamento muscular ou tendíneo para aliviar contraturas.
  • Transferência de tendão para melhorar o alinhamento muscular e a função motora.
  • Osteotomias para corrigir desalinhamentos ósseos ou luxações.
  • Artrodeses em casos de espasticidade grave, para estabilizar articulações.
  • Cirurgias voltadas para coluna, quadris e pés, visando postura, equilíbrio e mobilidade funcional.

A decisão sobre cirurgia depende do tipo e gravidade da PC, do nível funcional da criança (se é deambuladora ou não) e da resposta a terapias anteriores.

Recuperação e reabilitação pós-cirúrgica

Após a cirurgia, o acompanhamento com fisioterapia é essencial para garantir mobilidade adequada, fortalecimento muscular e adaptação ao movimento corrigido. O uso de órteses, treinamento de marcha e exercícios de alongamento complementam o processo. A recuperação varia conforme o procedimento e a criança, mas o objetivo é sempre maximizar a independência funcional.

O sucesso do tratamento depende da participação ativa da família:

  • Seguir as orientações médicas e de fisioterapia de forma consistente.
  • Observar sinais de desconforto, dor ou alterações na marcha.
  • Garantir o uso correto das órteses.
  • Manter comunicação aberta com a equipe de saúde, tirando dúvidas e registrando evolução.
  • Apoiar emocionalmente a criança, celebrando conquistas e incentivando a autonomia.

Cada criança com paralisia cerebral é única e apresenta desafios e capacidades próprias. Por isso, o acompanhamento individualizado com ortopedista pediátrico e equipe multidisciplinar é essencial para garantir o desenvolvimento seguro e funcional. Intervenções precoces, combinadas com cuidados contínuos e adaptados às necessidades de cada criança, podem transformar a mobilidade, promover independência e melhorar significativamente a qualidade de vida.

Com orientação especializada, informação clara e dedicação da família, o tratamento ortopédico deixa de ser motivo de preocupação e passa a ser um passo concreto para o bem-estar e a autonomia da criança.